Eram precisamente 5 horas da tarde, anunciadas pelas cinco badaladas do sino da igreja. Ao som das badaladas, caiu a última folha da árvore do jardim em frente à igreja, como que selando o Outono e apresentando oficialmente o Inverno. O céu, já bastante escuro, não tinha uma única nuvem, fazendo prever uma bela noite estrelada, uma perfeita noite para namorar, não fossem os 2º que o termómetro da farmácia marcavam. E como sempre, lá ia ele.
Ele não se sabe quem é. É apenas, como diz a Dona Gina, "o rapaz das 5". Todos os dias, sem excepção, precisamente às 5 horas em ponto, ele passava. Ninguém sabia de onde ou para onde, por quê ou por que não. Sabiam, apenas e só, que àquela hora, ele passava. Fizesse chuva, fizesse sol, fosse vendaval ou dia normal, lá ia ele. Já todos na vizinhança se perguntavam quem era o rapaz.
Quanto a ele, apenas se pode descrever o físico. Era alto, era provável que no seu documento de identificação, que nem se sabe se era bilhete de identidade ou cartão único, tivesse uma altura de 1,90m, ou alguma medida muito perto dessa, e quanto ao peso, parecia ser o ideal, pois não era nem gordo, nem magro. Não devia ter mais de 17 ou 18 anos. Tinha o cabelo curto, castanho, com um penteado-despenteado seguro por uma boa dose de gel. Os olhos só se sabia que não eram claros, pois nunca ninguém o tinha olhado nos olhos para saber qual a sua cor. Vestia-se bem, com um estilo clássico moderno que encaixava perfeitamente com todo o resto. Era, segundo as jovens que o viam passar, um belo rapaz.
Sobre ele, tirando o que saltava à vista, só sabia que não se sabia nada na verdade. Sabia-se que não andava em nenhuma escola nas redondezas, pois os jovens do bairro nunca o tinham visto na escola, não trabalhava em nenhum dos negócios do Sr. Miguel, o dono de quase tudo que havia naquelas bandas, desde o supermercado onde trabalhava a Dona Gina, ao Talho do Bairro, às fábricas de confecção, calçado e afins.
Nunca ninguém se tinha perguntado o porquê de terem reparado no rapaz. Ele simplesmente passava, todos os dias, às 5 horas da tarde. Nunca tinha incomodado ninguém, nunca tinha sido mal educado com ninguém, mesmo quando o Tozé o molhou ao passar com o carro por cima de uma poça. Essa foi a única ocasião em que se tinha ouvido a voz dele:
- Não faz mal.
Foram as únicas palavras proferidas pelo rapaz das 5, em resposta ao pedido de desculpas do Tozé.
Certo dia, Joana, neta de Dona Gina, movida pela enorme curiosidade que o rapaz das 5 causava a todos lá do bairro, decidiu segui-lo. Como sempre, entre a quarta e a quinta badalada do sino, ele cruzava a esquina, atravessando o jardim em frente à igreja, desaparecendo depois de atravessar a estrada e virar para o lado da casa da Rita. Tentando passar despercebida, Joana seguiu-o. Tal como ele, atravessou o jardim e a estrada, e virou para casa da Rita, mas não o viu.
Nesse dia, ninguém viu mais a Joana, nem no outro, nem no dia seguinte a esse. Ninguém sabia dela. Também ninguém sabia que ela tinha seguido o rapaz das 5. O reboliço no bairro era tanto com o desaparecimento de Joana, que ninguém tinha reparado que desde o dia em que ela desaparecera, nunca mais se vira o rapaz das 5.
A curiosidade matou o gato!
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