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segunda-feira, 16 de maio de 2011

Ele, Ela e A Outra VI

Voltou ao quarto, e Ele estava agora de calças e em tronco nu. Precipitou-se na direcção d’Ela mas foi prontamente afastado. Ela apoiou-se na cómoda de costas para ele, agora sentado aos pés da cama. Fitou-o pelo espelho, e num acesso de raiva, arrastou tudo que estava sobre a cómoda. Abriu as gavetas e tudo quanto lhe veio à mão foi também jogado ao chão, enquanto soltou um grito de raiva profunda. O telemóvel começa a vibrar-lhe no bolso, e num acesso de raiva atirou-o na direcção do quadro, fazendo ricochete e tombando o candeeiro da mesa-de-cabeceira.
E agora, estavam os dois ali, sem falar com tanto para dizer, a ensaiar um discurso em silêncio. Ela não estava em si. Em breves instantes o seu mundo desabara. Estava tão feliz não havia nem uma hora, e agora, estava ali, sem saber o que fazer ou dizer. Num súbito acesso de raiva, agarrou nas chaves do carro e saiu disparada porta fora.
Ele continuou no quarto, não tinha coragem de ir atrás dela, já a conhecia, sabia que ela precisaria de espaço e pressioná-la só aumentaria a sua fúria. Não a censurava. Até achava que a reacção d’Ela fora bastante branda. Ele tentou colocar-se no lugar d’Ela, e em nenhuma das hipóteses que conjecturara conseguiria ser tão brando. Dirigiu-se à casa de banho para passar o rosto por água. Não suportava olhar-se ao espelho. A ideia de ter traído aquela que tanto amava por uma simples relação carnal fazia-o sentir nojo de si próprio. Repudiava-se a si próprio por ter deixado toda a situação chegar àquele ponto, ponto esse onde perdera o controlo de tudo. E agora estava ali, só, sem se suportar a si mesmo. Foi até à sala, agarrou na garrafa de whisky que recebera de prenda no Natal que estava no bar da sala, e despejou uma generosa dose no copo. Bebeu tudo de uma só vez, e voltou a encher novamente, um copo a seguir ao outro, até deixar a garrafa vazia, perder o equilíbrio e ficar estendido no chão, tal era o estado de embriaguez.
Ela conduzia o carro mal conseguindo ver o que se encontrava diante dos seus olhos, de tão molhados que estavam das lágrimas. O rebentar das ondas nas rochas sob aquela forte luz de luar era a única forma que sentia ser possível acalmá-la. Fez todo o caminho numa condução irregular porém conseguiu chegar sã e salva à falésia. Desde que se conhecera como gente que frequentava aquele lugar, em pequena com os seus pais, em adolescente com os namorados, e ultimamente, só. Aquele local funcionava como que um retiro espiritual. Quando o trabalho se tornava demasiado stressante ou a relação com ele tinha um momento menos bom, ia para lá, ver o Sol pôr-se lentamente lá ao fundo no horizonte, ou então ver o reflexo da lua brilhante num mar ondulado. Estacionou o carro, saiu e dirigiu-se à extremidade da falésia. Devia ter uma distância de não menos que uns quinze metros até ao mar. Fechou os olhos e abriu os braços. Respirou fundo, como se disso dependesse a sua vida. E ali ficou, perdendo a noção do tempo, do espaço, de tudo. Não sabia se tinham passados poucos minutos ou várias horas, mas sentiu-se leve por instantes ou horas, que não sabia precisar.

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